quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Velha Recordação de um Velho Natal


O nosso Natal de família era simples, simples, mas para nós encantador, pois que todas as tradições eram cumpridas, ano após ano ,sempre iguaizinhas e sempre muito queridas
Pairava Festa no ar, e era um prazer sair, olhar as montras, respirar o perfume dos pinheiros e das acácias em flor que nos traziam da serra a pureza do ar; encontrar amigos todos atarefados nas suas compras, trocar impressões sobre o andamento dos preparativos.
Eu acompanhava sempre a minha mãe, de mãos dadas, chapéu de feltro argolado, as trancinhas apertadas num laço de fita azul- escuro.
Uma vez, encontramos uma rapariga de Machico, terra do encanto da minha mãe e onde tinha muitas amizades. O encontro foi alegre – olá, Isabelinha! Como estás? Como estão todos os amigos que lá deixei? Então já principiaste a fazer a tua lapinha? Ah! Menina Dora, tenho tanta tristeza, o meu rapaz mais pequeno quebrou as sagradas canelas do Menino Jesus! Minha mãe riu-se muito com aquela santa irreverência que ficou gravada na minha mente.
Em casa já se limpavam as pratas com pó de giz e os móveis estavam renovados com uma mistura de azeite e aguarás; o criado já lavara o soalho da casa de cima a baixo, o uso da cera não era habitual.
Morto e esquartejado o porco, amassados os bolos de mel, os pikles já muito apertados nos frascos com molho de mostarda, era chegado o tempo de preparar a doçaria : cavaquinhas, broas de mel, encantos de massa leve, bolos de família, queque inglês, geleia de vinha coroada com uma avenca sempre a tremer e o espectacular plum-pudding, que era servido em chamas e que aguçava a nossa gula , era o momento alto da noite de Festa.
A nossa sala era enorme, ao fundo, o pinheiro com o presépio armado com papel pardo, pintado, os junquilhos, as cabrinhas, os peros vermelhos e as tangerinas adocicavam o ar.
Para dar início à festa, apagavam-se todas as luzes ficando nós, somente iluminados pelas luzes das velas que se espalhavam por todo o lado A minha mãe ao piano e a nossa querida tia Eva tocavam e cantavam uma conhecida canção de Natal. Abrir os presentes, cear, ocupavam-nos o resto daquela bela noite.
No dia 25 íamos à missa a Sª Clara e depois jantávamos às 14 horas como era costume nesse tempo, com a minha avó Margarida que exigia que a refeição fosse servida à hora exacta, dada pelo relógio ancestral, jantar ao qual não faltava o delicioso pudim de pão .Durante a tarde, o nosso programa predilecto – jogar aos escondidos com o nosso pai. Os esconderijos eram preparados com antecedência para dificultar a prova; uma vez fiquei escondida dentro duma saca, que já há vários dias estava dependurada num estendal! Foi bem difícil o pai encontrar-me!



Na primeira oitava: visita anual a uma prima que nós adorávamos, à Calçada do Pico, senhora encantadora, com olhos azuis profundos e que nos falava entusiasticamente das estrelas, que observava com muito interesse. E a conversa deslizava sobre os principais acontecimentos da família. Num dado momento, lembrei-me e pedi à minha mãe: conta, conta a história do rapaz que tinha quebrado as “santíssimas patas do menino Jesus”…
Credo em cruz, Abrenuncia…..
Maria80

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

CORRE TEMPO, CORRE TEMPO, CORRE CORRE


O MEU VESTIDO DE NOIVA

Casei em Lisboa na Igreja de S. Jorge de Arroios.
Tudo aconteceu como num sonho: a beleza do vestido, a elegância dos convidados, o luxo dos automóveis, o mestre de cerimónias, o almoço num Hotel ´chic da capital, a lua de mel n Estoril.
Tudo belo, perfeitíssimo, ao mais alto nível
CORRE TEMPO CORRE TEMPO FOGE FOGE...

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

CORRE TEMPO, CORRE TEMPO, CORRE, CORRE...


O MEU PRIMEIRO VESTIDO DE BAILE
O meu primeiro baile teve lugar na quinta onde vivia o Cônsul brasileiro; era pai de cinco filhas, com as quais eu convivia ; sempre à procura de divertimentos organizaram um baile formal para o qual eu fui convidada. Como era costume na época, foi chamada a costureira para fazer o meu vestido. Era de organdi cor de rosa lavrado, enfeitado com fita de veludo preta e muito, muito rodado como eu sempre sonhara. Lembro-me que usei ao pescoço um colar com uma medalha preta de ónix com um eme em pérolas. As minhas amigas elogiaram-me muito.
Foi uma noite magnífica, com liberdade para me divertir e dançar, dançar, dançar.
Nessa época, estavam no Funchal muitos militares e não houve falta de pares: furriéis, oficiais, tenentes, não os distinguia pelas patentes e tanto dançava com um cabo, como com um capitão, não interessava!!!

domingo, 26 de setembro de 2010

CORRE TEMPO, CORRE TEMPO, CORRE, CORRE...


O meu primeiro exame

No tempo da minha infância, era costume, as meninas estrearem um vestido novo, no dia em que iriam fazer o seu exame de quarta classe (actual 6º ano do ensino básico) O meu era muito bonitinho, de cassa , azul claro, estampada com tulipas brancas, decote quadrado arrematado com uma barra branca, igual motivo nas manguinhas. Recordo essa etapa da minha vida que principiava, com intenso realismo.
O exame, realizar-se-ia numa Escola na Rua da Carreira e vivo ainda o nervosismo que senti, para prestar essa prova. Feita a chamada, ao subir devagarinho a escada que me conduziria, no meu lindo vestido azul não era azul o meu estado de alma. Jamais esquecerei esse momento, julguei que morreria, mas não morri.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

A minha Primeira Comunhão



CORRE TEMPO, TEMPO CORRE, CORRE, CORRE…
A MINHA PRIMEIRA COMUNHÃO
Quando estava preparada para fazer a Primeira Comunhão a situação financeira da família estava em
crise, o Banco Reid’s Castro falira e meu pai, assim como todos os colegas foram para o desemprego.
Mas a minha vida religiosa tinha que percorrer o seu percurso, por esta razão tudo se realizou com a
maior simplicidade, a cerimónia realizou-se na Capela do Lactário pobre, à Rua da Mouraria. As crianças
todas de branco, tinham em comum uma coroa de rosas brancas numa imitação modesta de Santa
Teresinha de Jesus. Vesti para a ocasião, uma túnica de cetim branca, emprestada, que encimada pela
coroa de flores e pelo véu me fez sentir que esse dia era muito especial. Os Cãnticos das religiosas e o
clima em que tudo decorreu, deu-me uma sensacão de paz e alegria que não se esfumou pelo facto, de
em casa não ter havido chá, bolo nem ofertas. Foi um dia feliz do qual ficou uma foto, para sempre recordar
CORRE TEMPO, TEMPO CORRE, CORRE, CORRE…

quinta-feira, 29 de julho de 2010

A vida...com vestidos


A vida . . . com vestidos
Chegou o meu octogésimo terceiro aniversário natalício, o que significa que já vivi 30 295 dias, o sol cumprindo a sua missão: nascer todas a manhãs e recolher-se ao fim de cada tarde. Reflecti, quantos vestidos usei nesta fila infindável de dias, qual manifestação sindical? Em que vestido me alegrei? Sofri? Consoante os acontecimentos da vida. Penetrei nas brumas do passado e foi possível recordar alguns.
A Escola primária
A minha infância foi muito feliz, tinha um quintal grande para brincar, correr. Gostava muito de cozinhar no meu fogãozinho de folha cor -de -rosa embora a receita fosse sempre a mesma: couves cozidas com tomatinhos de lagartixa, que agora se vendem nos supermercados com o nome requintado de “tomate cereja”.
Um longo mirante onde me debruçava horas e horas a ver passar, ininterruptamente, carrinhos de cesto, transportando turistas, na sua maioria alemães, que viajavam em excursões denominadas Alegria do Trabalho, no tempo do Hitler. Como vivia próximo do cemitério de Sª Luzia via passar muitos funerais, que me inspiravam a enterrar, com muitas flores, passarinho ou abelha que encontrasse mortos no jardim. Também gostava muito de ir para a cozinha escutar as histórias da criada da minha avó, a Josefina, que me falava de factos ocorridos nas outras casas onde trabalhara, suas rezas: Pedro e Paulo foi a Roma e o Senhor o encontrou, Pedro e Paulo donde vens? –Senhor, venho de Roma, Pedro e Paulo o que lá há? – Senhor muita “zerpela”, volta lá Pedro e Paulo, toma palma e oliveira e cura desta maneira: ó “zerpela” maldita quem te deu essa morada? Foi o vento foi a neve foi a grande tempestade. – Vai-te “zerpela” maldita, vai para o fundo do mar onde não oiças nem galo nem galinha cantar nem bicho d’apavoar. Meu pai arreliava-me pelo facto de eu estar muito tempo na cozinha e então dizia – esta pequena vai ter mentalidade de sopeira.
Mas chegou o dia fatídico de entrar na escola primária. Aos dez minutos para as 14 horas , com um vestido de tobralco branco com moranguinhos vermelhos, descia eu a Calçada da Encarnação, pela mão da criada. O relógio da Sé tocava uns repiques que me causavam um desespero surdo, adivinhando o sofrimento que me esperava – aprender a Ler - como desejei tanto continuar a ser ignorante mas que não me tirassem os meus hábitos e brincadeiras; lágrimas, morangos, saudades da minha mãe, tudo envolvido em mais lágrimas; Como quereria estar nesse momento a ver o trabalhador da fazenda a cavar semilhas, a ouvir o ruído molhado do machado a cortar os troncos das bananeiras!

CORRE TEMPO, TEMPO CORRE, CORRE, CORRE…

sexta-feira, 16 de julho de 2010

2010 JULHO 16 FESTA DA VIRGEM DO CARMO


VIRGEM DO CARMO
VIRGEM BENDITA
DÁ-NOS A DITA
DO TEU AMOR
OH!NÃO ESQUEÇAS
OS FILHOS TEUS
VELA POR NÓS
Ò SANTA MÃE DE DEUS

sábado, 3 de julho de 2010


As máscaras no teatro
O Teatro é uma grande arte de comunicar. Os actores ao desempenharem o seu papel, transmitem-nos estados de alma e sentimentos consoante a sua perfeição na arte de representar, levando o público ao seu mundo, à sua história a ponto de este se esquecer que é um simples espectador.
Foram os gregos o primeiro povo a utilizar máscaras no teatro o que permite, com maior facilidade desempenhar personagens, as mais díspares: transformar um riso num sorriso, a frieza em cordialidade, o cinismo em amizade.
Fui ao teatro
A cena desenrolava-se num jardim e tudo estava preparado para festejar o aniversário de uma criança. Um relvado verde, verdíssimo, acolhia com verdes e naturais saudações os convidados.
Crianças, muitas crianças que com pistolas e metralhadoras atacavam-se uns aos outros com amizade falseando a guerra que estavam a travar. Ao meio do jardim, uma mesa repleta de guloseimas era assaltada, de vez em quando, pelos pequenos soldados que precisavam de força para atacar o “inimigo”.
Os adultos, um elenco feminino, com as suas máscaras, desempenharam com excelência o seu papel, parecendo felizes, trocavam conversas banais, nas quais, não havia máscara que escondesse o clima frio como o chá gelado que estava a ser servido. Ao meio da mesa, o bolo de velas estava pronto para que fosse cantado o “parabéns a você”. Com a habitual salva de palmas desfez-se a companhia, qual bolas de sabão coloridas e leves que se apagam rapidamente sem nos dar tempo para apreciar o seu colorido. As batalhas das crianças, essas sim, foram bem reais, não fora isso, teria sido uma triste festa de aniversário. Porquê? Porque não foi convidado o Amor.
Maria80

domingo, 23 de maio de 2010

CORAÇÃO PARTIDO


Meu coração deu um salto e caiu inesperadamente no chão, quiz apanhá-lo mas não consegui, voou para longe, longe!

Ele sempre foi maroto e de vez em quando pregava-me umas partidinhas, mas cair, fugir... foi uma primeira e dolorosa experiência.

Apareceu-me a Tristeza para carregar ainda mais minha triste tristura; é uma amiga indesejável que aparece sem ter sido convidada e cola-se, cola-se não há como livrar-me dela! Juntas tomamos o pequeno almoço, obriga-me a engolir sonhos e suspiros. Juntas, com indiferença, lemos o diário, política, desporto, acidentes mais ou menos graves, necrologia, aí sim, vejo com certo interesse qual a agência funerária que tem mais clientela! Até a Tristeza se ri! E neste contexto sugere-me a ideia de um lindo coração de cravos rubros, avermelhados pelo meu amor e ternura para preencher o vácuo deixado pelo meu fugitivo.

Esperam-me dias vazios, quantos? Vamos ao jardim mas noto que a sombra da Tristeza apaga o viço e a beleza das minhas flores, as folhas das árvores esticam-se, tristes, procurando o chão.
Passa, lá no céu, um avião, deixando atrás de si um rasto de liberdade, olho-o, endo os braços
e peço: leva-me para o desconhecido, onde poderei ser feliz, mas a minha companheira prende-me ao ler os meus pensamentos.

Por vezes, penso no meu coração, onde estará? Vai voltar de certeza, mas mais pequenino e cheio de cicatrizes, para o arrumar no seu canto, vou ter que aconchegá-lo carinhosamente.
A noite cai, é hora de deitar, vou para a cama, abraço-me á Tristeza e sonho com cravos vermelhos.

Maria80

sábado, 20 de fevereiro de 2010



DIÁLOGO COM O MAR,

Ódio

Somos vizinhos, todas as manhãs olho-te da minha janela, mas por vezes nem te cumprimento e tu, oh mar, ocupado no teu vaivém nem dás pela minha falta de cortesia.
Sabes porque te aborreço? Oprimes-me aqui fechada numa ilha cercada de espuma, qual bolo rodeado por “chantlly”, mas apesar de me sentir tua prisioneira gosto de dialogar contigo. Roubaste-me o meu bocado de céu, o meu bocado de mundo. Adorava ser anónima e percorrer avenidas cheias de ruído próprio de uma grande cidade, não recear encontrar-te ao virar de uma esquina; olhar gordos autocarros prontos a “parir” uma ninhada de gente, em cada paragem do seu percurso; sentir a Primavera nos rebentos das árvores. E meus amigos? Aos poucos foram desaparecendo e nem lhes disse adeus.
Houve tempo em que te pedi encarecidamente que, com tantas pedras que tens no teu fundo, me arranjasses um caminhinho, só para mim, para que eu correndo, correndo fosse lá ver o que tinha deixado e correndo, correndo, voltasse para a minha solidão. Sabes o que é Saudade? É o desejo de voltar a ver lugares onde fomos felizes. E qual foi a tua resposta? Caminho?! Já não bastou o caminho que as caravelas me abriram para chegar ao Oriente. Se desejasse ser rasgado teria ajudado os soldados do Faraó a atravessar o Mar Vermelho.
Agora, adivinho-te, és cruel, indomável e esmagador. És matreiro, fazes amizade com o vento e cobres-te de “ovelhinhas” a ver se atrais algum pastor, também com esse aliado retiveste uma caravela, além no horizonte, que trazia um lindo vestido de noiva que chorosa teve que adiar o seu casamento até que decidisses pedir ao teu amigo que enfunasse as velas do barco.
Decididamente odeio-te, quando chegar ao meu fim não quero ser reduzida a cinzas e atirada às tuas águas, quero terra fofa donde brotam flores coloridas e perfumadas.

Amor

Sabes quando me conquistaste? Eu sei e já te conto: Há alguns anos atrás, foi planeado em família, passar uns dias de férias no Porto Moniz. Como ainda não tínhamos carro, um chauffeur de praça nosso vizinho, o snr. Francisco Roque, levou-nos até lá. Era um excelente condutor, apitava em todas as curvas e era um conversador exaustivo, explicava tudo, tudo, certo ou errado, referia-se às leis da Física para justificar o ruído que o carro produzia ao passar nos cubos de cimento, colocados à beira da estrada. Sabia os nomes das fajãs, rochedos e suas lendas.
Para me alhear de tanta informação, pois nesse tempo a viagem era longa, deixei-me enlevar pela beleza dos caminhos…olha, além, uma capelinha tão pitoresca, ladeada por duas árvores frondosas, adequava-se a um casamento furtivo. À subida da Encumeada, tentava “apanhar” alguns farrapinhos de nevoeiro, que corriam perdidos da mãe. E as casinhas isoladas trepando montanha acima!!!
E o táxi sempre a apitar despertando a floresta que ainda não acordara; os novelos à beira da estrada alindavam-se para conquistar quem por eles passava.
À saída de S. Vicente e iniciando a percorrer a estrada á tua beira, deslumbraste-me com tanta beleza, oh mar, as praias de calhaus que chupavas ruidosamente ao escorregares entre as pedras; as rochas, altivas, impenetráveis que lambias constantemente com tua espuma; as poças, ora cheias ora vazias conforme a tua agitação.
Além, nas piscinas, a água leve, leve, como que gaseificada, ficou retida por um colar de rochas , aos recortes qual caseado de bordado Madeira, e permite aos visitantes o prazer de um excelente banho. Aproximo-me, convidas-me a entrar, molho os pés, e tu, num movimento de empatia, acaricias minha pele, como um namorado a tactear a sua amada. Rendo-me ao teu amor, vem, dá-me um abraço de vento, um eterno abraço de tempo.
Maria80










quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010


MARGARIDA, Flor,

as suas palavras elogiosas fizeram de mim um "poço de vaidade", defeito este que eu sempre tenho combatido ao longo da minha longa vida.
O seu nome veio embelezar o meu jardim e também me trouxe doces recordações. Fiquei feliz por me ter encontrado no infindável espaço da net.


Teresa

domingo, 24 de janeiro de 2010



UM JANTAR DE SUCESSO

A hora do jantar aproxima-se, o grande father puxa ritmadamente os minutos para que se façam horas.
A sala está resplandecente, as luzes dão relevo e beleza às peças antigas expostas em antigas mesas e estantes. Os antúrios artisticamente dispostos, gritam com a sua cor contra as sombras dos recantos. Uma sonata de Beethoven, quase em surdina, embala os bisavós, cujos quadros emoldurados a ouro testemunham a ancestralidade da família.
Ela, a dona da casa, olhou em seu redor, cansada, mas feliz, como um atleta a cortar a meta.
A NOITE TINHA QUE SER UM SUCESSO
Eis que chegam os convidados. O prazer do encontro, a alegria de receber e ser recebido, a conversação animada, fluida, simpática, fazendo esquecer a cerimónia que o relacionamento impunha. Os whiskies, os aperitivos escolhidos com esmero, os risos, as quase brejeirices criavam um clima acolhedor.
UM SUCESSO
O jantar vai ser servido: a entrada deliciosa da qual não apetecia sair, o prato de peixe perfumado com ervas aromáticas, lembrando o campo onde tinham sido colhidas; o gelado de limão, divino, preparava o paladar para as carnes, estas acompanhadas por souflés de queijo, fiambre e legumes variados, arrancados a contra gosto das hortas que lhes deram vida e cor. Os vinhos – O branco, vivo no aroma, com um leve toque tropical, cheio de frescura incomparável, porque servido a preceito – 13ºC. Tinto – com aroma de frutos maduros, uma frescura e acidez bem equilibradas, envolvente na boca, claro, tudo isto a 18ºC. O Madeira que não chegou a ser servido, notável pela sua estrutura aromática, lembrando passas e baunilha, austero, de longo curso, de difícil escolha – beber ou guardar?
UM SUCESSO
A dona da casa envaidecida com o requinte do serviço, desejosa de receber um olhar de apreço, olha para o marido, que nesse momento exacto, engasgado, está a levantar-se com ruído e sai precipitadamente da sala. Era impossível disfarçar o sucedido, caiu nos convivas um silêncio tumular. Ela, a mulher, vai ter com o marido, que lhe diz dramaticamente – engoli a minha prótese com três dentes. O ambiente congelou. O pudim, receita conventual, foi esquecido. O velho Madeira, que não foi saboreado, irá continuar serenamente o seu envelhecimento.
UM INSUCESSO
Como superá-lo? Sómente meditando nas doutas palavras do sábio monge Zen Riokan, que há longos anos disse – Quando te encontrares com a infelicidade é bom encontrares – te com ela e eu acrescento na mesma linha – quando te encontrares com o insucesso é bom encontrares-te com ele.

Maria80

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Você gosta de música Clássica???


O Natal está a chegar, é tempo de fazer alguns docinhos. Fiz areias que já estão no forno a cozer.

Para evitar que se queimem, sento-me em frente do fogão para controlar a sua cozedura. Lógico, sempre que me sento a minha gata Eva salta imediatamente para o meu colo, é sossegadinha e a sua calma deixa-me meditar. No tabuleiro, as areias, há pouco informes estão ficando arredondadas e perfeitinhas, comparei-as com as crianças, que no calor e amizade dos pais, também se deixam modelar. E todas estas reflexões para eu poder compreender porque gosto tanto de música clássica.

Lá em casa, os meus pais conversavam e ouviam boa música, por vezes um trauteava qualquer melodia para verificar se o outro adivinhava o seu nome e o do autor. À tarde, muitas vezes, sentavam-se no escritório a ouvir óperas nos velhos discos de vinil. E nós, raparigas, ao subir ou descer as escadas da nossa velha casa ou ao percorrer os seus longos corredores, apanhávamos alguns trechos das músicas que pairavam no ar.

Mais tarde casei, nasceram filhos e a música já era outra. Algumas raras vezes que apanhava na televisão, algum programa musical mais selecto, logo o meu marido perguntava-me: - estou na oficina do mestre Carlos?

Mas, marido na eternidade, filhos casados, estou livre para escolher os programas que mais aprecio e vingo-me assim.
Graças ao canal Youtube tenho ao meu dispor tudo o que gosto e aprecio ouvir. Sempre acompanhada pela Evinha passo tempos indeterminados a "saborear" os belos acordes que incrívelmente sairam da alma dos compositores. Estava, uma vez extasiada com a 5ª Sonata de Beethoven , tum tum tum tum, a gatinha acordou e olhou para mim intrigada. Evinha disse-lhe eu - não te perturbes que é o destino a bater à porta deixemo-lo entrar, tum tum tum tum.

Ao som destas maravilhosas melodias, sinto-me como o rapaz da história infantil que subiu, subiu, bem ao alto do feijoeiro, que lhe nascera no quintal, eu também trepo, trepo e lá no alto deixo-me balançar, prosaicamente, com os feijões a me roçarem o rosto.

Voltando à minha mãe, que me conduziu por este caminho, ela gostava não só de ouvir, mas tinha gosto em transmitir, e nesse sentido, levava por vezes, para a cozinha o antigo gramofone e respectivos discos, numa tentativa para cativar as criadas para a boa música. As pobres ignorantes que só conheciam as músicas das bandas dos arraiais, no entanto, ouviam pacientemente a lição cultural que lhes estava a ser dada.

Anos mais tarde, encontrei uma antiga criada da minha mãe, que me disse: Que saudades eu tenho da Sª. D. Dora e das músicas que nos ponha a ouvir, Credo! Abrenúncia.!

Eu própria, tentei uma vez, levar as minhas netas pequenas a um concerto ao Centro de Congressos, o programa era convidativo - Zarzuelas e bailados espanhóis. A minha neta mais pequena, foi ouvindo, foi ouvindo calmamente e por fim exclamou: Avó, tenho fome! Respondi-lhe: Minha filha, para um concerto não é costume trazer a cesta do pic-nic.


Maria80