sábado, 28 de maio de 2011

O PÁSSARO

O PÁSSARO
Há muito tempo que desejava conhecê-lo, pois os seus assobios já me eram familiares, ouvia-os nos supermercados, e nas ruas circundantes à minha casa.
Até que uma tarde, estava pacatamente a tomar um chazinho de ervas no Qualifrutas e… começo a ouvir os seus trinados. Disse-me uma amiga – é o Pássaro, um homenzinho que está sempre a assobiar. Levantei-me rapidamente e fui no seu encalço. – Boa tarde – disse-lhe eu, como o senhor assobia bem! Olhou muito sério para mim para verificar, penso eu, se estava troçando da sua arte. Mas a minha expressão era a mais séria possível. Respondeu-me – aprendi na telefonia e na televisão: a minha mãe só queria ouvir o Teixeirinha, eu então, comprei um radiozinho e passei a ouvir música todo o dia, a passear no quintal, sei cantigas modernas e românticas também. Aprendi a falar inglês, francês e alemão-- Conhece as músicas do Francisco José? Oh, se sei, oiça: meus olhos castanhos… e põe-se a assobiar, ficámos os dois parados no passeio, ele assobiando e eu… escutando, quando era uma passagem mais difícil, o Pássaro, levantava um braço ao ar, qual maestro a conduzir a sua orquestra. – E aquela muito antiga – perguntei novamente, De quem eu gosto nem às paredes confesso? – Mas, essa , não é do Francisco José, é do Toni de Matos e lá a assobiou com todo o entusiasmo. –Muito bem – aprovava eu.
Nunca demorara tanto tempo para chegar a casa! Mas era chegado o momento para me despedir do meu companheiro e, como ele é poliglota disse-lhe – nice to meet you, good bie. E continuei o resto do meu caminho, assobiando também eu, mas mal, muito mal o Bolero de Ravel que é a minha música predilecta
Maria80

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Publicidade de ontem e de hoje


Ontem como hoje, aposta-se na publicidade a fim de aumentar as vendas, os contactos, lançar novidades etc. sempre dirigida ao consumidor, aposta-se no poder da imagem que é superior ao das palavras.
Folheando alguns exemplares do antigo jornal Heraldo da Madeira do ano de 1905, foi-me possível entrar na dia a dia daquela época, quais as suas principais necessidades, ofertas comerciais e outras mais notícias.
Com grande destaque encontrei anúncios de inúmeros consultórios de dentistas, pois a preocupação de ter bons dentes não é moderna.
TOLENTINOS - esses conheci eu, pois o mais novo da família de algozes muito crucificou a minha infância, porque os meus pais eram clientes desse consultório. Que desespero! Enquanto o doutor me tiranizava, a minha mãe, ignorando por completo o meu desespero, dialogava serenamente com o médico; ele tinha um andar de pinguim e, mesmo de olhos fechados, sentia os seus passos balanceados a equilibrar um corpo gorducho, tinha um modo muito peculiar de dizer a palavra cussspir, que nunca esquecerei.
Dentro da especialidade, havia pouca concorrência, só encontrei dois outros anúncios:
ALBERTO MACQUERYS – Colocação de dentes, com ou sem chapa, aparência igual ao natural. Garante de uma boa mastigação.
Também o Dr. Eduardo Ascenção anunciava os seus serviços; ao contrário do que hoje acontece, pois lê-se um anúncio de estomatologista porta sim, porta não.
Mas, tratados os dentes, era possível e mesmo muito agradável saborear boa doçaria, a MERCEARIA LEALDADE OFERECIA um grande e variado stock de bolachas, rebuçados, doces dos mais saborosos.
A MERCEARIA FAVORÁVEL, pelos seus anúncios, disponha de muitos doces de “fructa”, para atrair a sua clientela. Com a aproximação do Natal anunciava-se venda de “assucar” branco a 250 reis o Kilo, Cacau da melhor qualidade a 800 reis o kilo. O melhor café de “marka S. Tomé e Angola, chá inglês anunciado por três figurinhas galantes; manteiga Burnay a 720 reis à venda na Mercearia União (antiga vacaria).
Também a moda ocupava o seu lugar.
LONDON HOUSE à Rua da Sé oferecia grande variedade de punhos, camisas, colarinhos.
A CHAPELARIA CAMÕES publicitava sua colecção de chapéus de palha do Panamá, feltros em várias cores a preços módicos.
A LOJA RESTAURAÇÃO – vendia leques, mitaines, luvas em seda e algodão etc.
Quanto a bengalas A LIBERDADD ao Largo do Chafariz 32 acabara de receber uma bonita colecção a preços convidativos.


COSMÈTICA – POMADA SECRETO para fazer crescer cabelos, barba e bigodes.
SAÚDE – para Anemias, Extenuação, Empobrecimento de sangue e Cor pálida recorreria-se às DRAGEIAS RABUTEAUX. Afecções Syphiticas, Vícios de Sangue, com XAROPE GILBERT encontraria a saúde perdida.
O HOSPITAL – pede amas.
Aprender “allemão” observando a “ortographia” moderna; l3$000 ições de Inglês por um professor com comprovada prática de ensino “méthodo” rápido e novo na madeira. Lições em classe por 3$000 reis por mez.
“Fugiu um papagaio cinzento”, dão-se alvíceras a quem o entregar na redacção deste diário.
Casas para venda, ao c ontrário do que hoje se lê em catadupa, não encontrei nenhum anúncio; só para alugar: “Aluga-se casa à Rua… com cinco quartos, água de beber e para lavar…”
Mas muito interessante é o estilo de escrita dessa época, por exemplo o funeral do snr. Fulano tal:
“… à beira do sepulcro o snr. Admirador do extinto, proferiu sentidas palavras de despedida, das quais apenas podemos transcrever alguns períodos fugitivos:
Ó que sombrio problema este da morte
Será verdade, que extinta a vida inerte e exangue o nosso ser se decompõe dos seus elementos primevos trazendo ao seio da natureza mãe, que lhe deu existência, o alento pelo agregado molecular, tal qual o planeta no âmago de que se extinguiu o calor….”
Depois de tanto pesar passemos aos programas culturais. A nossa juventude ficaria desolada com a escassês de programas de diversão: um ou outro concerto na Praça da Rainha, baile na Quinta Pavão e o Theatro D, Maria Pia a apresentar uma ou outra peça de teatro “Didia a mulher peixe. Que monotonia em comparação com os programas das nossas discotecas, arraiais, cortejos que enchem a nossa cidade de luz e música.
Mas , consultando a nossa imprensa diária, a venda de automóveis é muito publicitada, neste contexto chega-se ao exagero de publicar as fotos de alguns vendedoresl para que, olhando para os seus rostos, a conta bancária dos hipotéticos compradores, aumente num crescendo milagroso.
Muitos astrólogos, qual deles o mais negro, a prometerem sucesso, amor e dinheiro. Coitado o desgraçado que se convence de tanta mentira.
Mas , a grande novidade é a compra de ouro e prata: ELOYS, OUROLUX e muitos outros comerciantes que estão a aproveitar-se desta mudança de mentalidades. Lá vai o tempo em que a preocupação das raparigas era comprar um fio de ouro, que passava de avós para netas, mas agora, trocam valores reais por “uma viagem à Venezuela para ver o seu netinho.
Bem disse o poeta “POBRES DOS POBRES DOS POBREZINHOS.
Maria 80

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

ESTRANHA MANEIRA DE REZAR




Voltou!. Ele voltou! Não do exílio, nem da guerra mas de um mundo diferente. Contrariamente ao pai do filho pródigo, não lhe mandei fazer uma túnica nova, nem mandei matar um bezerro gordo , Vinha ensopado em saudade e extenuado de percorrer um tão curto-longo percurso; Instalei-o imediatamente no melhor quarto da casa, o meu quarto, bom, confortável, cheio de almofadas onde habitualmente me recostava desfiando minhas horas de solidão ou fazendo contas de cabeça. Nem pensei que ficava desalojada e que era premente arranjar onde dormir, mas dentro de mim tudo estava às avessas, perdera a nação do “estar”, não distinguia cores, tons, sol sombra e, neste modo de viver tão apático ,fui ocupar outro quarto da casa onde tinha uma caminha, era quanto necessitava. Ignorei a desarrumação que me rodeava: roupas, tábua de engomar, vassouras ,mopas, tudo o que era a mais lá estava arrecadado. E os dias iam passando sem me aperceber que tudo o que me rodeava era feio, sem graça. Não mais me lembrei das minhas almofadas, da minha linda colcha de crochet e outros mais pormenores que contribuíam para tornar o meu ambiente acolhedor.
Uma amiga veio visitar-me, voltou outra e outra vez, sendo sempre recebida no meu quarto trapalhão. Até que um dia explodiu e disse – não posso vê-la nesta confusão!!! Vou preparar-lhe o seu mundo, um mundo compatível com o seu “eu” Posso? Sorri-lhe e disse – só não dispenso a cama para aterrar o meu desânimo!
E dia após dia, a minha amiguinha chegava com sacos: tapete ,cortinas etc. tudo o que era necessário para que se desse uma completa transformação “tipo querido mudei a casa”—Isto, para mim é rezar --dizia-me a minha amiguinha, não frequento a igreja mas rezo , rezo á minha maneira. E foi neste espírito de oração que se fechou no meu quartinho e modificou-o por completo. Tenho a minha mesinha da saudade, com fotos dos meus queridos, a tv, a mesma, parece que diminuiu, e não afronta, o computador, orgulhoso, pousa numa mesa antiga, os meus santinhos, colocados numa escadinha amorosa, olham o céu mais de perto. Uma cama nova, coberta com colcha branca cujas franjas são o encanto da minha gatinha. Maple e almofadas de veludo, às riscas, tudo, tudo novo e alegre, nada falta no meu cantinho onde estou 24 horas por dia. Ao tirar a venda dos olhos, mal entrei exclamei –Querida, isto não é uma simples oração, isto equivale a uma missa cantada com Tedeum.
Depois de tudo isto, resta-me um desejo, mas impossível de realizar: ter uma cauda de cachorrinho para abanar sempre para mostrar o meu regosijo.

Se alguém mais rezasse assim o mundo seria MELHOR!


Maria80